domingo, 18 de julho de 2010

O MEU CAMINHO - DEPOIS, Parte III

O meu pai habituou-me a olhar para trás quando se termina qualquer trabalho para ver se ficou bem feito e dizia sempre “trabalho bem feito bem parece”. A esse hábito acrescentei, há muitos anos, o de reflectir, para além da estética, na relação entre o projectado e o conseguido, no que ganhei ou perdi, na forma como cheguei ao resultado e o que mudaria se iniciasse agora a mesma actividade. Hoje em dia, sistematicamente, antes de fazer qualquer coisa que saia da rotina, penso sempre na razão de o fazer, ou seja, nas minhas motivações e se elas fazem ou não sentido, no meu projecto de vida. Em forma de conclusão, é disso que vou falar de seguida.

O espírito de aventura foi suficiente me decidir a fazer o Caminho de Santiago, mesmo sabendo que quem o faz tem, normalmente, outras motivações, nomeadamente religiosas. Estava, contudo, de espírito aberto. O meu projecto inicial era fazer o Caminho sozinho e o blog a forma de partilhar a aventura. Tive consciência de que fazer o caminho com companhia ia prejudicar a componente aventura, mas abria outras perspectivas de enriquecimento do resultado final.

Fui um peregrino como tantos outros, mas não senti que essa componente tenha influenciado o meu estado de espírito ou meu entusiasmo. De facto, a viagem foi a um lugar de devoção e pagamento de promessas, mas apesar de não ter promessa para cumprir nem sentir grande devoção beneficiei de toda a mística que envolve o apóstolo, o Caminho e os Peregrinos. Também não me pareceu que a generalidade dos peregrinos tenham grande devoção. Comum a todos é a grande satisfação pela proeza, manifestada com abraços, gritos e saltos.

A Catedral estava em obras na zona de entrada. Fiquei admirado com o facto de os “abraços ao Apóstolo” continuarem durante a missa.

Em Espanha, fiquei surpreendido com o respeito e atenção dados aos peregrinos, quer pelas pessoas em geral, quer especialmente pelos automobilistas, e pelas entidades públicas. As marcações do caminho são de tal forma precisas que dispensam qualquer apoio de GPS, os Albergues são muitos, os automobilistas levam a cortesia quase ao extremo e as pessoas são voluntariosas sempre que as questionamos.

É fantástico encontrarmos pessoas das mais diversas origens e falarmos com elas, quase como que já as conhecêssemos . No caminho, todos os peregrinos se saúdam da mesma forma. Há um objectivo comum que é chegar

Não tenho dúvidas de que o resultado final ultrapassou, substancialmente as expectativas. As únicas dificuldades dignas de nota foram a queda no segundo dia e um terceiro dia bastante demolidor.

Foi um bom presente para mim próprio conseguir este feito e constatar que continuo a ser capaz de atingir as metas que me proponho.

Fiquei mais rico. Conheci mais pessoas, o Hélder Neves, o Miguel Sampaio, a Manuela, o Pinto Leite, o Miranda, os Martinho, entre outros. O meu companheiro de viagem revelou-se uma pessoa calma, ponderada, experiente, humilde, uma excelente pessoa. O Miguel Sampaio, um estudiosos dos Caminhos de Santiago, hospitaleiro, voluntarioso, disponível, um amigo. A Manuela, a calma em pessoa, persistente, paciente e pedala que se farta. O Pinto Leite, com a sua calma, também um bom amigo. Os Martinho, a simpatia de um casal, ninguém nos teria recebido melhor.

Pouco mudaria se voltasse a fazer a mesma viagem. Teria um pouco mais de cuidado com a análise dos caminhos menos conhecidos. A gestão passo a passo funcionou bem.

Descobri que a bicicleta é uma efectiva forma de viajar. Com ela, tudo depende de nós. Tudo o que conseguimos é vitória nossa. Tudo tem outro sabor, as paisagens, os caminhos, o que vemos e ouvimos e até o que comemos.

Agora, só uma razão de força maior irá impedir a próxima viagem de Btt. Já tenho novos projectos, pelo menos um deles para colocar em prática ainda este ano e os Caminhos de Santiago estão incluídos.

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